(Cartas de Terras Insondáveis - I ou XXII)
Como tem passado?
Por aqui vai passando o cavaleiro azul pela ponte, sob corvos que já não voam mais, feras pastam entre girassóis e gritos, não nos vemos há mais de cem anos, como você vai? Vou indo. Passou rápido, não?
Nossas telas são eletrônicas, freqüências fragmentadas, fast forward é o que nos apraz, velozes chegamos até onde o vento faz a curva sem dizer adeus e pode ser encaixotado e ganhar o nome de ar-condicionado.
Eu já vi neve no freezer de alguém.
Entre em contato conosco – não falei com deus em uma página de internet.
Um deserto épico entre o corredor e o carpete.
Um decerto ético entre o elevador e a quitinete.
Uma rima pobre como todos nós.
E ainda assim
O mesmo grande assombro.
O mesmo grande assombro diante da respiração de todas as coisas.
O mármore é macio sob o peso imensurável do tempo, fios rotos de um relógio de pano tecendo a história, átomos que outros já respiraram no andar dos mortos sob a luz-lembrança das estrelas que já não são mais. Lacuna de luminosidade movente nos poros da terra, sombras da árvore ao pé de todas as coisas: o mesmo grande assombro.
Havia uma esperança
Na escada torta
E um cisne acre-doce
Quando eu subia:
Não há mais.
Havia um lacre
No vão da porta
De um crime
De cara roxa
Quando eu entrei:
Não há mais.
Havia uma dúvida
Pendurada na orelha
No sopro de búfalo
À frente do carro
E do caminho
Que engendra a semente
Dentro de tudo
O imaginável:
Ainda está lá.
Lá bemol
Sol sustenido
No céu de papel
Cante comigo.
Um abraço no espaço-tempo que nos distende e
Aproxima,
L.
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